Avareza
Diz o texto sagrado que o Espírito levou Jesus ao deserto para ser testado pelo Demônio. Essa é a missão dos Demônios: testar os homens para saber a qualidade de que são feitos. A tentação só acontece no lugar onde mora o desejo. Ninguém é tentado a comer tijolos. Porque ninguém deseja comer tijolos. É preciso que haja o desejo para que a tentação aconteça. No deserto o Demônio começou o seu teste pelo desejo mais inocente, mais natural. Jesus estava com fome, depois de jejuar 40 dias. Queria comer. Com certeza estava tendo visões de pães. O Demônio sugere: “Um pequeno milagre vai resolver tudo. Você tem poder. É só falar e as pedras se transformarão em pães.” Que Deus bom esse, à nossa disposição para atender aos nossos desejos. Mas o Deus de Jesus não era assim. Ele não pode ser invocado para nos livrar dos apertos. “Nem só de pão viverá o homem, mas de toda palavra que sai da boca de Deus ...”, Jesus respondeu. O Demônio percebeu que aquele não era o lugar. Mudou-se para o lugar onde moram desejos mais sutis. Os piores pecados não são os da carne; são os do espírito. “Imagine-se na torre do templo. Lá embaixo a multidão gritando: ‘Pula! Pula!’. Aí você pula. Mas então o inesperado acontece: os anjos vêm e o carregam pelos ares! Será o triunfo, a consagração. Todos acreditarão em você e o seguirão!” Jesus responde que não se deve testar Deus para a realização dos nossos desejos. Aí o Demônio lança mão do mais profundo desejo que existe na alma humana: o poder! Leva Jesus a um alto monte e lhe mostra todos os reinos do mundo e suas riquezas e lhe diz: “Tudo isso lhe darei se prostrado me adorares!” Quem tem dinheiro tem todas as coisas. O dinheiro é o deus do mundo. O Vinícius inicia o seu poema O Operário em Construção citando esse texto do evangelho. O operário, no alto do monte, tentado pelas riquezas! Porque o fascínio pelo dinheiro não mora apenas no coração dos ricos. Mora também no coração dos pobres. Avarenta é a pessoa que adora o dinheiro. Mas esqueça as imagens comuns do avarento – o pão-duro, o unha-de-fome, o mesquinho... Esse avarento é um coitado. Faz mal a pouca gente. Ele é o maior prejudicado. Da sua companhia todos fogem. Ele é ridículo. Avareza não é isso. É uma qualidade espiritual. O avarento é uma pessoa cujos olhos passaram por uma transformação: eles só vêem coisas e pessoas através do dinheiro. Todos os seus sentidos estéticos e éticos foram destruídos. Beleza, ternura, amor, honestidade, justiça – essas coisas não entram na sua contabilidade. Por que o avarento se entrega ao amor ao dinheiro? Porque ele sabe que o dinheiro é um deus que tem poderes para operar as mais fantásticas transformações. Marx era bom teólogo; ele conhecia o poder do deus dinheiro para operara milagres. Vejam os comentários que ele fez de textos de Goethe e Shakespeare. “Eu sou feio, mas posso comprar a mulher mais bonita para mim mesmo. Conseqüentemente eu não sou feio, porque o efeito da feiúra, o seu poder para repelir, é anulado pelo dinheiro. Como indivíduo sou um aleijado, mas o dinheiro me dá vinte e quatro pernas. Portanto eu não sou aleijado. Eu sou um homem detestável, sem honra, sem escrúpulos e estúpido, mas o dinheiro é objeto de admiração universal e portanto eu, que tenho dinheiro, sou admirado. Sou curto de inteligência, mas desde que o dinheiro é o espírito de todas as coisas, como poderia aquele que o possui não ser inteligente? Eu, que pelo poder do dinheiro, posso possuir tudo aquilo que o coração humano deseja, não sou possuidor também de todas as virtudes humanas.”Pense nas misérias do Brasil. Elas não foram produzidas pela ira, pela preguiça, pela inveja, pela gula, pela arrogância, pela luxúria. Esses demônios são fracos. Nossas misérias são produzidas pela avareza. As delícias da riqueza justificam qualquer tipo de corrupção. Pense nas tragédias do mundo, as guerras, os genocídios... Esses sofrimentos foram produzidos pelo uso de armas que foram pensadas por inteligências científicas e fabricadas com cabeças técnicas e vendidas por amor ao lucro. Mas quem é movido pela avareza não sabe o que é o sofrimento dos outros. Perdeu a capacidade de compaixão. E com isso deixou de ser humano.
Rubem Alves
E aí Wgner, beleza?
ResponderExcluir"tentação só acontece no lugar onde mora o desejo."
Somos seres movidos pelo desejo. Por isso, o desejo é o grande motivador da vida ou a negação da vida autêntica.
Cabe a nós decidir.
abraços calorosos, meu amigo
Gostei muito do artigo; estava a escrever sobre isto. Obrigado ajudou-me muito a explanar este sentimento que ando a observar e me encomoda.
ResponderExcluirAtt. Bella
Oí Bella
ResponderExcluirQue bom você por aqui!
Espero que possamos compartilhar e nos ajudar em Deus mutuamente.
Volte sempre que puder e quiser.
Um abraço
Olá mano, isso explica tudo, preciso falar mais??? Olha pra dentro das nossas igrejas!!!
ResponderExcluirEngraçado que hoje na aula de história da igreja III,com o prof. Isaias foi comentado sobre as calamidades cometidas pela igreja "oficial" pós reforma, é impressionante a similaridade...